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Lideranças no Seminário em Angra dos Reis - RJ |
Pela
primeira vez, em mais de 14 anos de atividade no semiárido baiano, as
Indústrias Nucleares do Brasil (INB) admitem a contaminação da água em Lagoa
Real, município limítrofe com Maniaçu, distrito de Caetité, onde opera a única
unidade de mineração e concentração de urânio ativa na América Latina, a cerca
de 700 km de Salvador, capital da Bahia. Mas nem um órgão competente tomou
providências para proteger as populações da região. Comunicado do prefeito de
Lagoa Real Francisco José Cardoso de Freitas informa em maio passado, que o
poço do Sr. Oswaldo, na comunidade de Varginha, naquele município, seria
“fechado por ser considerado impróprio para o consumo humano, baseado no
boletim de análise feita pela INB.”
Só que o
aviso do prefeito tem quase três meses, sem que o poço tenha sido lacrado. A
população de Lagoa Real está perplexa com o descaso dos gestores municipais e
exige uma ação concreta incluindo a análise independente da água de mais três
poços que os comunitários suspeitam estarem contaminados. Esta denúncia foi
feita pelo representante da Comissão Paroquial de Meio Ambiente de Caetité,
Gilmar Santos, durante o seminário (07/08/2015) que discutiu, em Angra dos Reis
(RJ), os impactos e prejuízos do Programa Nuclear Brasileiro. Em Angra, estão
as usinas atômicas da Eletronuclear, atualmente alvo de investigação na
Operação Lava Jato, por suspeita de envolvimento na corrupção relacionada à
construção de Angra 3. Gilmar
também relatou outros prejuízos causados à região, como o aumento de casos de
câncer e outras doenças causadas por radiações ionizantes.
MONITORAMENTO
DEFICIENTE
Enquanto
isto em Caetité, a INB espalhou um boletim (des) informativo em julho, onde
afirma que “as águas dos poços apresentam nível de radiação seguro para
consumo”. Sem fazer nem uma menção à contaminação do poço de Lagoa Real,
garante que a análise de amostras de águas subterrâneas de Caetité, colhidas em
2014, aponta um nível de urânio abaixo do fixado pelo Ministério da Saúde e
pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente. E faz, como sempre, a autoproclamação
da excelência do monitoramento ambiental que realiza em Caetité.
Contudo, seus autoelogios
não convencem a população, nem a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), nem
o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (IBAMA), que tem registrado crimes
ambientais e caracteriza os relatórios de monitoração ambiental da INB de
‘incompletos, inconsistentes e inócuos’. Técnicos
do IBAMA apontam falhas graves na
base do Programa Nuclear Brasileiro, como a falta de manual para situações de
emergências e procedimentos gerais de segurança, saúde e meio ambiente e a não
correção de várias irregularidades determinadas em diversas ocasiões.
Ainda assim, em abril
passado, o IBAMA concedeu Licença de Instalação para que a INB explore nova jazida em Maniaçu,
composta de três cavas a céu aberto, surpreendendo, mais uma vez, a população
da região. Afinal essa mesma jazida foi alvo de recomendação de autuação por
técnicos do IBAMA, em 2013, já que por mais de oito anos, a INB suprimiu
vegetação do local, sem a devida autorização legal.
CRIMES SOCIOAMBIENTAIS
Desde 2012, o laboratório da
Comissão de Pesquisa e Informação Independente sobre Radioatividade (CRIIRAD)
da França, que tem qualificação técnica
certificada pelo Ministério da Saúde e é reconhecido pela Autoridade de Segurança Nuclear da França, vem
fazendo o Monitoramento do Impacto Radiológico da Mina de Urânio em Caetité.
Em relatório recente, afirma que
o monitoramento ambiental da INB sobre a primeira mina que explorou, a
Cachoeira, tem deficiências graves, como a falta de resultados para o
monitoramento da radiação gama no ambiente, a deposição de poeira no solo, a
contaminação do solo e da cadeia alimentar, o monitoramento das águas
superficiais e sedimentos e a impossibilidade de avaliar a concentração de
radônio no ar.
O CRIIRAD considera
urgente que a INB faça o monitoramento das atividades de radônio, porque ele
pode ser muito elevado nas águas subterrâneas, podendo provocar dose de
contaminação muito maior do que o próprio urânio; também sugere o monitoramento
do polônio 210, um metal radioativo, que associado ao urânio 238, torna-se uma
das substâncias mais radiotóxicas quando ingerido. Se com a exploração da mina Cachoeira, a INB arrasou com o
meio ambiente, imagine o que vai ser da região com a exploração de mais três
cavas, sem que o passivo deixado em Cachoeira tenha sido devidamente avaliado.
As populações afetadas
consideram inaceitável que a CNEN e IBAMA permitam que a INB continue a minerar
urânio, sem que históricas determinações de correção de irregularidades tenham
sido executadas. Também
consideram inaceitável que as
autoridades responsáveis pela regulação e fiscalização de atividades
degradadoras do meio ambiente e que ameaçam a vida das pessoas admitam que a
INB continue repetindo os mesmos crimes ambientais e sociais, que vem cometendo
há mais de 14 anos, quando iniciou a exploração do urânio na Bahia, gerando
tantos prejuízos para a região e sofrimento para seus moradores, trabalhadores
e ex-trabalhadores.
Zoraide Vilasboas
Associação Movimento Paulo Jackson - Ética, Justiça, Cidadania
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