Precisamos olhar à nossa volta com mais gratidão, acolhendo com satisfação as coisas e as pessoas que já são parte de nós, de nosso caminhar, desacelerando nossa pressa em obter mais.
Parece que estamos sempre ansiando pelo que ainda não temos, por
coisas e vidas que não são nossas, numa constante necessidade de alcançarmos
mais e mais. Não nos satisfazemos com o que já possuímos, pois temos a
impressão de que a vida alheia é sempre melhor do que a nossa, de que o outro é
mais feliz do que nós. Nessa toada, deixamos de prestar atenção ao que está ao
nosso lado e assim não conseguimos direcionar nossas ações ao que realmente
importa.
Em tempos líquidos como os que vivemos, perdemos o
interesse rapidamente por aquilo que conquistamos, uma vez que os apelos
midiáticos nos incitam ao consumo desenfreado de bens que carregam a ilusão de
conter a felicidade dentro de si. Nada mais parece suprir o que nos falta;
aliás, mal sabemos com clareza do que precisamos, enquanto nos abarrotamos de
quinquilharias inúteis que largamos pelos cantos da casa.
Nesse contexto, vamos aos poucos perdendo a
capacidade de reter em nós aquilo que nos traz prazer e satisfação,
esquecendo-nos de que a felicidade necessita se aninhar aqui dentro, para que
enxerguemos com lucidez momentos e pessoas que fazem toda a diferença em nossas
vidas. Tudo, pois, torna-se descartável e fugaz, ou seja, deixamos vazio o
espaço íntimo de nossa essência humana, a ponto de esse espaço em branco
endurecer nossos corações.
Deixamos de valorizar as pessoas que caminham
conosco e as conquistas que já são nossas, olhando somente além do que é real,
para nos perdermos nas idealizações fantasiosas de uma vida supostamente mais
feliz e que não é nossa. Relegamos ao segundo plano quem nos ama
verdadeiramente, quem carregou nossas bagagens, quem nos deu as mãos nas horas
de desespero, quem procura pelo nosso olhar diariamente, porque apenas nos
concentramos naquilo que está longe, distante.
A ambição é necessária, para que alcancemos aquilo
que temos a capacidade de obter, para que não paralisemos. No entanto, é
preciso que nos realizemos também a partir do que já possuímos em nossas vidas,
sentindo-nos realizados diariamente, ao lado de quem nos ama de verdade. É
preciso que direcionemos nossos esforços na busca pelo que realmente nos
enriquecerá como seres humanos, no que nos trará a felicidade junto aos nossos
queridos, ou desejaremos tão somente o preenchimento material e frio de uma
existência vazia e solitária.
Precisamos olhar à nossa volta com mais gratidão,
acolhendo com satisfação as coisas e as pessoas que já são parte de nós, de
nosso caminhar, desacelerando nossa pressa em obter mais, para que nos
aconcheguemos prazerosamente junto ao amor sincero e reconfortante que nos
rodeia todos os dias. Porque nada nem ninguém haverá de suportar – ou de
merecer – o retorno vazio diário e intermitente, tampouco existirá amor que
sobreviva à negligência e ao desprezo afetivo por muito tempo. E, quando finalmente
nos dermos conta do quão felizes nós já somos, poderá então ser tarde demais.
Fonte: Obvious
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário